sábado, 23 de agosto de 2014

Música entre parênteses, na língua da esperança

Você já pensou e ouviu uma música que não tem letra, mas é cantada numa língua inexistente e sem sentido gramatical? Você já pensou em um álbum inteiro só de músicas assim e que conseguisse transmitir algo? Um álbum sem nome, de músicas sem nome, sem lera, num conjunto de instrumento e voz que ressoam sentimentos que se despertam, pouco a pouco, dentro de nós mesmos, como algo que sempre esteve ali, mas a gente nunca soube. Sim, existe.
             O dia era 28 de outubro de 2002. Naquele dia o mundo conheceu a mais nova pérola dos islandeses do Sigur Rós. O álbum "( )". Isso mesmo, um parêntese que abre e outro que fecha, demonstrando que o trabalho simplesmente não tem nome. Mas vamos voltar um pouquinho mais. Sigur Rós é um nome em língua islandesa que significa rosa da vitória. A banda surgiu em 1994 lá nas distantes e geladas terras da Islândia e três anos depois lançou seu primeiro trabalho, "Von" (Esperança). Um clima tenso, ao mesmo tempo épico e de extrema profundidade, foi o ponto de partida para o trabalho que viria a ser lançado dois anos depois. Em 1999, "Ágætis byrjun" (Um bom começo), foi ao menos e definitivamente um bom começo para a banda, ao menos no que se refere à forma com que o quarteto da terra do gelo impressionou o mercado musical mundo afora. Não é a toa que músicas como Svefn-g-englar ainda são uma das mais lembradas, não só do Sigur Rós, como de toda uma legião do gênero post-rock.
E aí chegamos então ao século XXI. Era hora de Jónsi, Georg, Orri e Kjartan mostrarem mais um pouco do que eram capazes. E foi aí que surgiu o "( )". Você pode chamar de parênteses, álbum sem título, seja lá no nome que queira dar. A intenção da banda não era trazer um trabalho pronto, cheio de nomes e letras prontas, de músicas com um significado único que não tem a intenção de mudar. A música no "( )" é sem pretensão, sem boa nem má intenção, sem vontade de grudar, ela é simplesmente música, e cabe a quem ouve sentir o que quiser sentir de cada faixa que, do fundo da junção de melodia e sensibilidade, quase que representa os aspectos da vida que todos passamos: otimismo, tristeza, melancolia, amor, felicidade, raiva...
Mas cabe a cada um de nós interpretar e sentir, do jeito que achamos melhor. Não é a toa que o encarte do álbum é composto por doze páginas em branco. E lá, quem quiser pode registras as emoções e sentimentos extraídos da música. Criar seu próprio significado para o "vonlenska", a língua da esperança, que não existe na prática, que pode representar apenas um bando de sílabas sem sentido, mas que cantada no tom quase angelical da voz de Jónsi, junto com a melodia, o ritmo e a sensibilidade, cria um universo único.
“( )" não é um álbum para ouvir enquanto faz outra atividade, assim, para passar o tempo e simplesmente para isso. As músicas se completam, e ao mesmo tempo são únicas. De "untitled 1" a "untitled 8", são como um grande ciclo da vida, que do início até o fim, tem seus caminhos, suas dificuldades. É um álbum a ser explorado por quem ouve, e, mesmo que soe estranho no começo, para quem quer conhecer Sigur Rós, é uma incrível descoberta.